sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Acolhimento dos simples

Antonio Cesar Perri de Carvalho
Na trajetória do Movimento Espírita sempre foi muito marcante a ação dos espíritas no atendimento dos socialmente carentes. Esta dedicação contribuiu significativamente para se assegurar a respeitabilidade dos espíritas junto à comunidade, aos poderes públicos e à mídiaTodavia, se historicamente esse é um fato inconteste, a simples observação mais ampla dos frequentadores dos centros espíritas e alguns dados estatísticos sobre o perfil dos espíritas, desde os anos 19901 até esta década,2 apontam para a realidade de que, usualmente, a frequência às reuniões espíritas está concentrada em pessoas da faixa social média e, em algumas regiões, com ligeira tendência para patamares superiores. Ou seja, os integrantes das faixas sociais menos dotadas geralmente comparecem mais como assistidos e, em proporção, são menos representativos até como espíritas declarados.

É chegado o momento de avaliarmos as causas que levam a esse cenário. Quais as razões de o Espiritismo não ter sido efetivamente difundido e/ou não se comunicar mais facilmente entre os mais simples? Por que há poucos, ou inexistem, centros espíritas nos bairros mais periféricos? Sugerimos que sejam analisadas a adequação e a compatibilidade dos centros espíritas para o atendimento da Diretriz 1 do “Plano de Trabalho para o Movimento Espírita Brasileiro (2007-2012)” onde há a recomendação:

Difundir a Doutrina Espírita, através do seu estudo, da sua divulgação e da sua prática, colocando-a ao alcance e a serviço de todas as pessoas, indistintamente, independentemente de sua condição social, cultural, econômica ou de sua faixa etária.3

Com esse parâmetro, algumas questões sobre o fluxo de pessoas dentro do Centro Espírita merecem reflexões e avaliações: a recepção e o atendimento fraterno aos novatos; os esclarecimentos sobre as atividades da instituição; o real acolhimento, como o enlaçamento fraterno aos frequentadores e colaboradores, propiciando, inclusive, eventuais visitas aos seus lares; orientação e apoio às reuniões de Evangelho no lar; o nível das exposições nas reuniões públicas; o nível e a duração dos cursos oferecidos; as opções de atuação, atendendo-se à diversidade das condições das pessoas que se dispõem a colaborar; o atendimento às necessidades de apoio, orientação e equilíbrio a problemas mediúnicos; a disponibilidade de livros com conteúdo, redação e preço compatíveis com as faixas sociais mais simples, e algumas outras opções que se caracterizam como prática da fraternidade e da caridade de natureza espiritual.

Desde as obras da Codificação, há considerações oportunas sobre o acolhimento e atendimento dos mais simples, como em “Missão dos espíritas”:

Ide, pois, e levai a palavra divina: aos grandes que a desprezarão, aos eruditos que exigirão provas
, aos pequenos e simples que a aceitarão [...].4

Há subsídios recentes e interessantes que robustecem a citada orientação de Erasto:

[...] deveríamos refletir em unificação, em termos de família humana, evitando excessos de consagração das elites culturais na Doutrina Espírita, embora necessitemos sustentá-las e cultivá-las com respeitosa atenção, mas nunca em detrimento dos nossos irmãos em Humanidade, que reclamam amparo, socorro, esclarecimento e rumo.
[...] Não consigo entender o Espiritismo, sem Jesus e sem Allan Kardec para todos, a fim de que os nossos princípios alcancem os fins a que se propõem.5
Nós deveremos trabalhar muito pela disciplina na Casa Espírita, mas não podemos olvidar dos sentimentos, tendo em mente que um grande número de neófitos, que busca nossa Casa, é constituído por pessoas muito sofridas, que não encontraram respostas além, e vêm até nós buscando entendimento, cordialidade. Eis uma das funções do Atendimento Fraterno, porque graças a um bom Atendimento Fraterno, a pessoa se sente em casa.6

Avançai no rumo do progresso estendendo, porém, a mão generosa e o coração afável àquele que se encontra na retaguarda, necessitado de carinho e de ensejo iluminativo. Dai-lhe o pão, mas também a luz, na verdade, oferecei a informação doutrinária para demonstrar-lhe quanto vos faz bem esse conhecimento, em face das transformações morais para melhor, que vos impusestes, logrando os primeiros êxitos...7

Esses norteamentos dispõem de recomendações gerais para ações no Centro e no Movimento Espírita nos documentos de trabalho aprovados pelo Conselho Federativo Nacional da FEB, além do já citado “Plano de Trabalho”, principalmente no capítulo “Atendimento Espiritual no Centro Espírita”, em Orientação ao Centro Espírita8 e no item “Incentivar a criação de Centros Espíritas
em bairros e cidades, quando necessário”, em Orientação aos Órgãos de Unificação.9

Ponderamos também que para esclarecimentos evangélicos à luz do Espiritismo direcionados a
pessoas simples, livros com lições ensinadas pelo Mestre – no estilo de Jesus no Lar –,10 são oportunos para o entendimento da mensagem cristã. Sem qualquer ideia de proselitismo, entendemos que o acolhimento dos simples no ambiente das reuniões espíritas é tarefa de primordial importância nos tempos que vivemos. Lembramos que o Espiritismo está no momento preciso para cumprir seu papel – de consolo, apoio, esclarecimento e contribuição para a libertação espiritual –, notadamente na etapa da grande transição que já vivemos:

[...] o Consolador, que é o Santo Espírito, que meu Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará recordar tudo o que vos tenho dito.11

Referências:
1 CARVALHO, Antonio C. Perri de. Espiritismo e modernidade. Visão de sociedade, família, centro e movimento espíritas. São Paulo: USE, 1996. p. 88-92.
2 IBGE. Perfil das despesas no Brasil. Disponível em: . Acesso em 17/11/2010.
3 PLANO DE TRABALHO PARA O MOVIMENTO ESPÍRITA BRASILEIRO (2007-2012). In: Reformador. ed. esp. ano 125, n. 2.140A, p. 30, jul. 2007.
4 KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 20, it. 4.
5 CARVALHO, Antonio C. Perri de. Chico Xavier – O homem e a obra. São Paulo: USE, 1997. p. 80-81.
6 FRANCO, Divaldo P. Conversa fraterna: Divaldo Franco no Conselho Federativo Nacional. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. p. 28.
7 ______. Vivência do amor. Pelo Espírito Bezerra de Menezes. In: Reformador. ed.esp. ano 125, n. 2.138A, p. 37-38, mai. 2007
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